terça-feira, 9 de dezembro de 2008

parte 3 ..continuação ..fim


Esta força de baixo, que seria Cam, é feita para servir os outros.Claro, ela não pode estar por cima, como ocorre atualmente. A Razão, representada pelo Céu, deve pôr tudo em ordem.Quando Noé sai da arca, levanta um altar para Deus e, tomando os animais e as aves puros, oferece-os em holocausto. Qual o simbolismo disto? Por que só sacrifica as energias puras? É muito interessante: Noé toma todos os tipos de energias puras e oferece-os ao Mais Alto. Aqui podemos pensar em qualquer tipo de energia. Vamos evitar a velha e mal compreendida idéia de sacrifício. Sacrificar é, na verdade, tornar divino, tornar sagrado.
Como entender bem este ponto? Se não oferecermos nossas energias a Deus, estaremos simplesmente lançando-as fora. Elas podem tornar-se emoções negativas, representadas, por exemplo, por uma sexualidade “jogada” para a terra. Nesse caso, as energias não “sobem” no sentido de transformar o Ser. Vejam aqui, novamente, o simbolismo das águas do dilúvio, que levam Noé para cima, para “o alto do monte Ararat”. Fica clara, no texto, a questão da energia: Noé “solta na terra” todos os animais. Uma parte de nossa energia, representada pelos animais impuros, vai naturalmente para a terra. Deve, portanto, ser gasta no planeta. Outra parte, simbolizada pelos animais puros oferecidos em sacrifício, deve subir para o sentimento, para o peito e para a cabeça, promovendo, assim, a transformação de nosso Ser.Muito interessante! Toda a beleza consiste no estabelecimento da hierarquia. Pensando nas energias puras, vejo-as como Amor, como anseio de perfeição, aspiração ao belo, ao bem, à força, desejo de saúde e felicidade. Sinto que foram essas coisas que Noé ofereceu ao Divino. Existe também todo um outro universo de forças que estarão simplesmente atuando no mundo. E não há problema nenhum Deve ser assim, não é? “A César o que é de César e a Deus o que é de Deus.” O mundo foi construído desse modo. Sem dúvida! Mas tudo que foi dito aqui deve ser usado no trabalho interior. Notem que esta história é uma saga sobre o trabalho interior.O sacrifício dos animais seria o sofrimento voluntário?Sem dúvida. A própria construção da arca representa o sofrimento voluntário. Noé está sofrendo a ação dessa chuva torrencial e ininterrupta, que simboliza tudo o que nos submerge na vida: nossos negócios, o emprego perdido, a corriqueira falta de recursos, os problemas dos filhos, enfim, todas as intempéries da vida.Resumindo rapidamente a história, no primeiro momento, vejo Noé construindo a arca, sofrendo e sobrevivendo ao dilúvio, saindo da arca, soltando e sacrificando os animais. Em um segundo momento, vejo a embriaguez de Noé e o que acontece com seus filhos. Entendo o momento de embriaguez como a causa de toda a reorganização da Terra.É preciso reordenar sempre. Em certo sentido, assim que Noé sai da arca, acontece um novo dilúvio. Todos os dias há dilúvios ocorrendo no mundo todo, o tempo todo. A arca deve ser continuamente construída.
Vocês poderiam perguntar: “não chega o dia em que a arca fica pronta”? Observem em si mesmos a resposta: o trabalho interior lhes permite enfrentar uma série de coisas com uma nova força, com um novo poder. A arca poderia também representar um Ensinamento iniciático, como o nosso, que nos protege dos vários pequenos dilúvios pessoais.
Uma história como esta fornece um número ilimitado de indicações. Percebo que demos apenas uma “pincelada” no estudo da arca: não examinamos a simbologia de suas medidas, o fato de ter três andares, a abertura lateral e as sete pontes internas, as nove divisões, com sua perfeita vedação e impermeabilidade. Sobre a vedação da arca, podemos dizer que ela é filha do próprio Noé, pois simboliza o recolhimento. Nada pode entrar nela, nem sair. A arca armazena nossas energias internas, no silêncio e na escuridão. De certa maneira se assemelha a um forno, o forno alquímico. É a própria imagem da prática da calma: fica-se em silêncio total enquanto “o pau está comendo lá fora”. Esse “pau comendo lá fora” pode ser tomado como os pensamentos que surgem durante a prática, por exemplo, e nós ficamos ali, com um “x” de energia bem concentrado. Dá a impressão de ser uma fissão atômica, liberando uma grande quantidade de energia.O relato bíblico diz que todos entram e, depois, Deus fecha a porta da arca. É fantástico pensar que Noé tinha de manter todo este povo dentro da arca, em harmonia. Imagine o que era, com todas as famílias de animais do mundo: um comendo, matando o outro, a “mulherada” convivendo, todas as fofocas...Uma vez mais, vemos que Noé significa descanso, paz, tranqüilidade, calma. Só essas qualidades podem juntar os opostos, unir aqueles que querem se devorar. Noé é, simbolicamente, o mesmo barqueiro de que o Sr. Gurdjieff fala no livro Encontros com Homens Notáveis: aquele que deve levar o carneiro, o lobo e a couve no barco. Quando se diz que ele “levou um animal de cada espécie”, está-se dizendo que ele é o harmonizador por excelência. É ele quem faz a aliança entre os opostos. A aliança não é o símbolo do casamento entre o homem e a mulher, seres de natureza oposta? Então, cada um de nós deve tentar unir seus opostos. Cada um de nós deve ser Noé!

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